sexta-feira, novembro 24, 2006

Escritos antigos, outra vez

enrolam-se nas suas roupas incandescentes
as mãos em esgares de raiva mal guardada
lançam ódios em palavras aguçadas
rosnam como lobos esfaimados

são os descentrados nas paisagens das palavras

são os donos das certezas esfarrapadas
os imaturos da vida ociosa
os emparedados nas suas vaidades
os que se cegam nos seus orgulhos ocos

o cilindro do tempo virá imparável
esmagará as loucas impotências
traçará nos caminhos desertificados
a vergonha do nada

como o espelho vazio

m.f.s.


em cima dos ventos que arrastam as vozes delirantes
dos perdidos em si
sob a sua leve textura de enovelados remoinhos zumbidores
para lá dos limites da inocência
as catadupas de negritudes embebem as almas
em nadas fluorescentes
de anúncios de filmes americanos

os planetas desconhecidos atacam os horizontes dourados
as areias erguem-se em finos véus
envolvem os viajantes desprevenidos
enfeitam-nos de resistentes escorpiões dos desertos

as vozes extinguem-se sob os mantos de neblinas
à espera dos seres alados que as tomarão para si

m.f.s.


deixa morrer o meu corpo deitado na duna onde o vento desenha espirais
deixa que as libélulas dancem sob o fundo azul de verão
que os meus olhos ceguem com o brilho das estrelas
que a espuma mansa do mar nocturno cubra os meus pés
enregelados

que o sol ao nascer não me veja nunca mais nesta paisagem

sobre a minha campa faz nascer alegres trevos de tenro verde
e flores amarelas
como se a areia mudasse a sua natureza e os trevos
se aproveitassem disso
como se houvesse um perpétuo véu de tule bordado a prata
estendido de mim ao horizonte da lua

espera pelo meu regresso montada na brisa matinal

m.f.s.

as vozes que se espraiam na paisagem lembram a minha condição
de humana fraqueza
nas correrias dos dias iguais
nos haustos do ar rarefeito
nas altitudes dos sonhos

as vozes planeiam desfazer-me em rugas de tempos alijados
nas planuras sem fim
nas arenosas colinas
nos entardeceres vívidos das memórias
emergentes

as vozes rasgam os tecidos das ternuras avidamente guardadas
em desconhecidos recipientes
onde se vão buscar as energias
impulsionadoras da resistência à loucura
dos resquícios do amor

as vozes não podem não conseguem apagar o lado divino
que me sustem
na universalidade
da minha humana fraqueza inscrita no destino
das harmonias infinitas

as vozes submergem
mudas

m.f.s.

Sem comentários: