segunda-feira, outubro 08, 2007

escrito

já não abro as cortinas pela manhã
não pesquiso as lagartixas nos muros
aquecidos dos mirantes sobre as fajãs
não afago os buxos frescamente aparados
fechei a água das fontes em recantos
remansosos

vesti as roupas dos lutos habituais

os sapatos bolorentos de verniz envelhecido
calço-os

agarro um terço de vidros roxos e cruz de prata
o chapéu de tules esgarçados
uma rosa branca
alguma coragem

sigo pelos subterrâneos até
aos campos onde se lançam
os derradeiros ossos
e os vermes se acendem

as crianças saltam
brilham como duendes
atiram pétalas sobre as campas
musicam gargalhadas
roubam a luz aos ventos das maresias

regresso aos subterrâneos da minha desolação
encho de velas os terraços
onde costumava fabricar bolas de sabão
pouso no carvalho velho e esgotado
palácio dos pavões e dos lagartos voadores
que pacientemente me esperam

mfs

2 comentários:

Anónimo disse...

...regresso aos subterrâneos da minha desolação
encho de velas os terraços...

é boa a sensação como tantas e tantas vezes me revejo na tua poesia.

Beijo

Isabel

fernanda disse...

Obrigada Isabel, és uma querida :)